23 outubro 2006

Por que tudo é urgente?

Um amigo meu reclamou ontem que a namorada dele mudou de emprego e já entrou na nova empresa num ritmo sem noção, coisa de 10 horas/dia para mais. A pessoa que ela entrou para substituir havia sido despedida por não se esforçar o suficiente, ela entrava todos os dias dez horas da manhã ao invés das 9 horas como era ditado por seu horário. Não, ninguém levou em conta que esta pessoa entrava às 10 mas, por conta da carga de serviço, saía quase todos os dias por volta das 23 horas, meia-noite.

Mais de uma vez isso eu vi isso acontecer na área que eu trabalho. Quando é algo que acontece uma vez por mês, em um fechamento de edição ou uma atualização brutal de algum site, é até aceitável - quando começamos na área de design sabemos que estamos sujeitos a isso. Um dos grandes problemas que levam a isso é o fato de nosso trabalho depender inteiramente da boa vontade de terceiros para coleta de material e, claro, como a grande maioria dos profissionais, estes não se importam que um dia de atraso na entrega dele é um dia a menos para que você produza decentemente a sua parte. No final, quando algo sai errado, todos apontam dedos para todos e em geral a culpa do erro recaí sobre desatenção da equipe que cuida da área de produção, independente de ter feito em três dias algo que originalmente era destinado dez que, por descaso ou incompetencência de outros, acabou por já começar sem uma parcela considerável e preciosa de tempo.

O sujeito pode virar noites trabalhando, dias sem tempo sequer de responder um e-mail ou mesmo postar algo num blog de tão consumido que está pelo trabalho (meu caso nos últimos dois meses). Pode fazer o dobro de horas mensais exigido por lei e/ou combinado por contrato, não importa, eles pagam seu salário e podem fazer você trabalhar o tanto que quiserem. Não há como se defender. Eles estão cientes da grande chantagem existente por trás de tudo, de que se você não cumprir com um horário que nem mesmo os carvoeiros do século 19 eram submetidos, existirá alguém que não preze vida pessoal e que arcará com toda essa carga, independente da qualidade do serviço (que nunca fica acima de mediocre) e da possibilidade de um belo dia a pessoa enfartar / surtar / entrar atirando no escritório / etc. Dane-se. Não é uma pessoa. É mão de obra e só. Não precisa se preocupar com o bem estar dela ou de sua família, desde que ela esteja garantindo o seu bem estar, desde que ela te faça grande aos olhos dos outros para que você alcance os seus objetivos.

Nunca tive problemas em relação a carga muito alta de trabalho, como eu disse antes, eu estava ciente que isso era uma possibilidade e aceitei a idéia. O que não me entra na cabeça é que não percebam o estrago que dois, três ou mais meses seguidos de trabalho deste tipo faz às pessoas, o quanto interfere na vida dela agora e o quanto vai interferir no futuro. Problemas de visão, tendinite, neurose, trombose, depressão entre outros não são coisas que vão ficar na empresa quando a pessoa partir, ela os levará por muito tempo ou até pelo resto da vida.

Pior é meia dúzia de "assimilados" que eu conheço que quando se levanta estes pontos ainda dão razão para as empresas, com frases feitas do tipo "esse é o jogo" ou coisas ainda mais exdrúxulas como "no pain, no game". Eu não entendo muito bem estas pessoas. Eu trabalho para viver uma vida relativamente confortável e, a partir do momento que eu deixo de viver por excesso de trabalho, trabalhar é algo que fica sem sentido.

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